caleidoscópio

  A chuva cai enquanto eu torço para que ela não vá embora até que meu corpo todo seja água. Com os olhos fechados, meu filme particular é quadriculado. Com o passar do tempo, sombras se projetam sobre as pálpebras, como se as próprias gotas carregassem as cenas de variadas projeções. Já fora de mim (e mais dentro dela) minha íris se transforma num arco íris. Eu e a acidez somos uma só então. A água que escorre pela calçada leva com ela tudo o de agridoce que eu possuía, ou pelo menos guardava na língua. E assim sigo descontínua em mim, como a água que corre em liberdade para o mundo incerto e embaçado rua afora, enquanto aqui dentro há sempre algo bonito sob o filtro do céu coberto de nuvens.
  Com o passar do tempo minhas emoções foram se perdendo com os milhares de sorrisos que eu descarregava (e ainda o faço) sem pudor pelos cantos em que passei. A emoção se tornou algo que se manifesta de forma inquieta em meu interior. Às vezes, quando o riso trava, as lágrimas vem. Por isso é muito fácil para mim chorar de alegria ou simplesmente me calar quando a felicidade vem num baque tão forte e precioso de vez em vez. Ainda me importo com o que pensam as pessoas da minha satisfação. Eu gostaria de conseguir fazê-las cientes de que minha felicidade sempre é recíproca, ainda que eu não demonstre muito bem ao entendimento das mesmas.
  A chuva me faz pensar nisso. A sensação que ela deixa quando vai embora, o aperto, como se fosse uma saudade daquilo que nunca se teve, daquilo que não se tem. Como a visão de uma velha e florida rua que sempre aparece nos meus sonhos. Como o cheiro que sempre fica depois da terra molhada. 



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meu nome é Luria. sou discípula de manoel de barros e um beco sem saída com histórias guardadas no peito pra serem descarregadas, ora em palavras, ora em imagens.

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